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Por que você escolheu estudar vitamina D? Minha história com a Esclerose Múltipla

Ressonância magnética
Ressonância magnética

Vitamina D é meu objeto de estudo como pesquisadora da área de Nutrição. Responder à essa pergunta tão simples envolve muitas questões pessoais e profissionais, íntimas e profundas, que me colocam em um lugar de vulnerabilidade que detesto.


Pode parecer exagero, mas a maioria das pessoas mais próximas e mais queridas irão descobrir que sou portadora de esclerose múltipla neste post. Não foi uma escolha consciente não contar, e sim uma negação e necessidade de provar que essa condição não afetaria em nada na minha vida a ponto das pessoas nunca saberem ou perceberem.


No dia 12 de dezembro de 2012 às 10 da manhã, recebi o tão esperado email que confirmava minha aprovação para o intercâmbio de graduação na Inglaterra com bolsa integral. Neste mesmo dia, às 20h, percebi que estava totalmente sem sensibilidade em toda perna esquerda.


Uma semana depois, a falta de sensibilidade subiu para o tronco e do lado esquerdo do meu corpo — fazendo uma divisão exata na linha do umbigo — eu não sentia nada.


Vinte dias depois, peguei o resultado da ressonância magnética que apontou a hipótese de Esclerose Múltipla (que gosto de chamar carinhosamente de EM), e não contei para ninguém (ninguém mesmo).

Digitei esclerose múltipla no google, e me apavorei.


No mês seguinte fui em quatro médicos na minha cidade e uma em São Paulo. Todos concordaram com o diagnóstico de EM, mas a de São Paulo levantou a possibilidade do que chamam de "Episódio único isolado não-específico". A recomendação era refazer a ressonância magnética um mês depois da primeira e se não tivessem novas lesões seria esse caso isolado e poderíamos ficar tranquilos.


Adivinhem o resultado da segunda ressonância? Novas lesões na medula e agora uma também no crânio. A recomendação agora era fazer o tratamento de pulso-terapia (altas dosagens de corticoides por cinco dias). Fiz o tratamento e dez dias depois embarquei para meu intercâmbio na Inglaterra.


Todos os médicos disseram que era impossível prever quando eu teria outro surto. Que mesmo tendo feito a pulso-terapia não tinha como garantir nenhum período de estabilidade .Acabei recuperando quase toda sensibilidade nos meses seguintes e não tive novos sintomas. Cursei oito disciplinas, não faltei nenhuma aula, visitei 13 países, fiz estágio em pesquisa científica, e aproveitei tudo que tinha para aproveitar.


Logo no primeiro mês de aulas neste intercâmbio, tive uma aula sobre vitamina D e me apaixonei pelo assunto! Fiz um estágio em pesquisa de julho a dezembro em um grande projeto de vitamina D e esse estágio resultou no convite para fazer doutorado direto em vitamina D com o mesmo grupo de pesquisa.

Me formei na graduação dia 15 de janeiro de 2015 e 01 de julho iniciei meu doutorado na Inglaterra. Até então, eu estava em negação sobre meu diagnóstico e, portanto, sem tratamento preventivo para controle da EM. Nunca mais tinha tido nada, então estava resolvido.


Mas em maio de 2016, tive meu segundo surto. Eu estava em um congresso, quando me toquei que estava sim em surto. Fui fazer uma anotação e mal consegui segurar o lápis, a letra irreconhecível. A dor no braço esquerdo que havia começado há alguns dias se intensificou daí em diante, até se tornar insuportável. A força motora foi diminuindo gradativamente. Fui internada, na ressonância não apareceu nenhuma lesão nova e por isso não fiz o tratamento.


Em 2017 troquei de médico, fiz todos os exames novamente. Fiz uma punção lombar que precisava dar positivo para pelo menos um de três marcadores — positivei dois. Pronto, diagnóstico de esclerose múltipla confirmado. Não tive como negar ou ignorar mais. Já tinha evidências suficientes que me forçaram a finalmente encarar a EM. Iniciei o tratamento com injeção intramuscular semanal de Beta-interferon (essa parte da história requer um texto separado).


Mas você está nesse momento se perguntando: ué, que fuga ao tema é essa? O QUE TUDO ISSO TEM A VER COM VITAMINA D ?


O primeiro slide daquela aula sobre vitamina D mostrava uma maior prevalência de esclerose múltipla em países de alta latitude (pouco sol portanto pouca vitamina D).


Esse estudo e o resto da aula me levaram a 3 epifanias:

  1. Lembrei que no momento do meu primeiro surto tinha deficiência de vitamina D severa.

  2. Na faculdade aprendi que não era uma preocupação em países ensolarados.

  3. De forma generalizada, a vitamina D não estava recebendo a devida atenção no Brasil. Bônus: até então nenhum médico havia acompanhado meus níveis (alguns haviam recomendado suplementação de forma generalizada).


Curiosamente, no aeroporto quando eu estava embarcando para o intercâmbio em 2013, meu pai me deu um livro chamado “Vitamina D: como um tratamento tão simples pode reverter doenças tão importantes” porque ele tinha visto no google que poderia ter uma relação com EM. Devorei o livro em poucos dias. Então, já estava com algumas questões latentes na cabeça.


Comecei a me interessar pelo assunto ao questionar os efeitos da deficiência em mim mesma. Li e estudei bastante o tema antes mesmo de me envolver em pesquisas. Percebi como ainda havia muito a ser pesquisado, principalmente na população brasileira. Entrei de cabeça no mundo da vitamina D, que além de parte importante da minha história (a história dos meus níveis, EM e minha suplementação também requer um texto à parte), se tornou meu objeto de estudo no estágio em pesquisa na graduação e no doutorado em Surrey, no estágio em pesquisa em Harvard e do meu pós-doutorado na UnB. Inicio agora em 2024, meu segundo pós-doutorado em Vitamina D e genética, na Universidade Federal de Goiás.


Trabalho com vitamina D há quase 10 anos, e a produção e divulgação de conhecimento científico para melhor a vida das pessoas se tornou uma missão. Sigo nessa trajetória com essa missão, cada vez mais grata por ter me encontrado (em tantos aspectos) nesse trabalho.





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